Composição de Chico Buarque para a peça teatral, A Ópera do Malandro, Geni e o Zepelim conta a história de uma meretriz que sempre foi atacada pela população da cidade fictícia da música, aos gritos de “Joga Pedra na Geni/Ela foi feita pra apanhar/Ela é boa de Cuspir”, a população derramava seu ódio sobre a pobre moça que se deitava com qualquer um.
Até que um certo dia, um Zepelim aparece na cidade, prestes a atirar com seus mil canhões e dizimar a população por completo, quando o Comandante desiste com a condição de que a Geni, se deitasse com ele. Na letra da música, ela resiste a ideia e precisa ser convencida pelas pessoas da cidade. Vão até ela, pedir que ela aceite o pedido do comandante, o prefeito, o bispo e o banqueiro.
Os gritos de ódio, antes comuns, se tornam súplicas. “Vai com ele, vai, Geni!/Vai com ele, vai, Geni!/Você pode nos salvar/Você vai nos redimir/Você dá pra qualquer um/Bendita Geni!” Após esses pedidos, mesmo relutante ela aceita e se deita com o comandante, salvando a cidade de ser destruída. Mas ao amanhecer, com os gritos de comemoração interrompem o sono de Geni. Os gritos voltam a ser os de sempre, com xingamentos a meretriz.
Nos dias atuais, a sociedade funciona do mesmo jeito para tratar alguns casos. Uma hora ama, outra odeia e assim segue este ciclo ininterrupto. Vamos usar um exemplo atual.
Nesta semana, uma moça faleceu alguns dias após dar à luz um filho. O óbito aconteceu no Hospital Geral Prado Valadares, mas algumas pessoas usaram este caso para acusar a Santa Casa de “negligencia”. Não perderam tempo e um movimento foi criado para acusar, mesmo sem provas, a maternidade e o profissional obstetra. Um grupo de WhatsApp foi criado para poder organizar um protesto e figuras conhecidas do grupo político do atual prefeito estão no grupo. Uso político de um caso de saúde pública sendo utilizado para atacar.
A relação de amor e ódio que a cidade de Jequié tem com a Santa Casa é interessante. Assim como a Geni da música de Chico Buarque, durante um período ela é amada pela população, mas quando se aproxima o período eleitoral, começam os gritos de “Joga pedra na Santa Casa”.
Agora fico pensando, sem a maternidade da Santa Casa, que atende quase 30 municípios da região, sem o módulo de oftalmologia, sem o centro de reabilitação, sem as feiras de saúde que o hospital filantrópico realiza durante todo o ano, como estaria a saúde municipal? Na música de Chico Buarque, a Geni foi quem salvou a cidade de ser destruída, nos dias atuais, a Santa Casa impede que o sistema primário de saúde entre em colapso.
Saúde é coisa séria e deve ser cuidada por todos. Usar casos trágicos como a morte de uma pessoa, para atrair capital político é cruel e nojento. As pessoas que fazem esse tipo de coisa não estão pensando na dor da família que perdeu uma pessoa amada, estão pensando única e exclusivamente em atacar a “Geni”. Qual o crime que a Geni da música cometeu? O próprio compositor deixa claro na letra: “Ela é um poço de bondade/E é por isso que a cidade/Vive sempre a repetir /Joga pedra na Geni!”
Finalizo esta coluna com o sentimento de que as vozes que ofendem, xingam e agridem as Genis, nada mais são do que vozes vindas de poços de maldade e rancor. Prefiro acolher a Geni. Assim como prefiro deixar que a justiça seja feita por quem de direito, esperarei laudo, autópsia e que, caso tenha havido negligencia médica, que o profissional seja culpabilizado, não a instituição, até por que, quem faz parto é o profissional e não uma instituição.
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